Está se sentindo um pouco “Xtranho” nesse final de ano? Porque o Rei Tuê está! O novo álbum de Matuê, “Xtranho”, chegou cercado de expectativa. Depois do sucesso de “333”, lançado em 2024, o rapper cearense volta a provocar a cena com um trabalho que promete ser disruptivo, mas será que entrega isso de verdade?

“Xtranho” aparece como um manifesto estético e sonoro do trap underground, um espaço em que Matuê sempre brilhou. Mas, ao mesmo tempo, deixa um gosto de déjà vu para quem esperava algo mais ousado ou mais pop.

Enquanto alguns críticos apontam que o artista deu um passo atrás, outros veem o álbum como uma celebração do cenário underground e uma reafirmação de sua posição como referência cultural do trap brasileiro.

Regresso ou volta às raízes?

Desde o início da carreira, Matuê construiu sua imagem sobre o contraste entre o sucesso comercial e a autenticidade do underground. Com “Xtranho”, ele parece revisitar essas origens, deixando de lado a tonalidade de “333” para abraçar uma estética mais crua.

O rapper abre o álbum com “REI TUÊ”, uma faixa que soa como declaração de intenções. O flow é agressivo, as batidas são sujas, e a mensagem é clara: ele ainda representa o bando, o selo 30PRAUM e a cultura de onde veio.

A revista Rolling Stone Brasil defendeu o álbum afirmando que essa volta às raízes “cumpre o que promete e dá visibilidade ao underground”, especialmente ao trazer nomes menos conhecidos como Kouth, Cashley, FAB GODAMN e Okie, que imprimem uma autenticidade que o mainstream raramente permite.

Porém, há uma dualidade interessante. Apesar da proposta, “Xtranho” foi lançado com megaestrutura e marketing pesado, incluindo uma audição no Vale do Anhangabaú para milhares de fãs — algo nada underground.

Em outras palavras: Matuê se coloca como o porta-voz da estranheza, mas sem abrir mão da estética de popstar. Isso gera uma tensão entre o discurso e a prática, algo que parte do público percebe como contradição, e outra parte vê como maturidade artística.

Faz sentido comparar “Xtranho” com “333”?

É impossível falar de “Xtranho” sem lembrar de “333”. O álbum anterior de Matuê foi um marco: misturava reggae, indie rock e psicodelia, explorando temas sobre sucesso e propósito. Em comparação, o novo trabalho soa mais direto — e, para alguns, mais superficial.

Críticos como Carol Prado, do G1, chamaram o novo disco de “um passo atrás”, dizendo que “de estranho mesmo no novo álbum do Matuê, só o tamanho do passo atrás que ele dá com esse trabalho”. A observação é dura, mas revela algo real: “Xtranho” não busca a profundidade poética de “333”.

Por outro lado, a comparação pode não ser justa. O novo álbum do Rei Tuê não vem para ser um novo “333”, quer ser outra coisa, melhor ou pior — dependendo de quem o ouve — mas com certeza com muita personalidade. A diferença está na proposta: “333” queria transcender o trap; “Xtranho” quer redimensioná-lo.

Em faixas como “Autobahn” e “Ícone Fashion”, Matuê faz o trap dialogar com moda e comportamento, transformando o gênero em uma plataforma estética completa — trap como experiência, não só som. Por outro lado, é em “Facas e Machados” que o disco atinge seu ponto máximo de caos e liberdade criativa. A faixa mistura nonsense, agressividade e humor, quase como se fosse uma paródia do próprio gênero. “Xtranho” pode não ser mais sofisticado que “333”, mas é mais performático. É como se Matuê quisesse dizer: o som é sujo, mas é meu.

Será que podia ser mais Xtranho?

Uma pergunta é provocativa — e necessária. O nome do álbum cria uma expectativa de ruptura total, mas o resultado é, em muitos momentos, seguro demais.

Há quem defenda que a força de “Xtranho” está justamente na autoironia controlada. Apontando que Matuê usa o desconforto como linguagem, criando um álbum que não busca ser bonito, mas ser verdadeiro.

Essa escolha o coloca em um território artístico curioso: Matuê não quer agradar. Quer provocar, mas dentro de um limite calculado — o suficiente para parecer audacioso, sem alienar o público que o consagrou.

Em termos de conceito, “Xtranho” é visual, performático e narrativo. O evento no Anhangabaú, o palco em forma de “X”, o site interativo e o design sombrio fazem parte de um mesmo universo. Tudo é pensado para criar uma experiência multimídia, onde o som, a imagem e o comportamento se misturam.

Ainda assim, fica a sensação de que Matuê poderia ir mais fundo. O álbum flerta com o experimental, mas nunca mergulha. É estranho — mas não tanto quanto o título promete.

Matuê anda mesmo um pouco Xtranho?

Depende do ponto de vista. Para quem esperava o mesmo impacto emocional e criativo de “333”, sim — Matuê parece andar um pouco “Xtranho”, no sentido de se repetir e jogar seguro. Mas para quem enxerga “Xtranho” como um movimento estratégico, o disco mostra um artista no controle da própria imagem, consciente de sua influência e disposto a redefinir o que significa ser mainstream no trap.

Ele não está perdido. Está testando os limites entre autenticidade e espetáculo, entre arte e negócio. E, nesse jogo, o que parece estranho é justamente o que o mantém relevante. Se o álbum divide opiniões, é porque cumpre um papel importante: faz o público discutir o que é ser “real” dentro de um gênero que virou produto.

Matuê não está em crise — está em transição. E talvez o que pareça estranho agora seja somente o início de um novo ciclo criativo. Quer continuar acompanhando os movimentos do trap nacional e as próximas fases de Matuê? Fique de olho no FT, aqui você sempre encontra novos lançamentos e novidade dos seus artistas preferidos!

Você também pode gostar de:

‘Sequência Cunt’: Pedro Sampaio celebra a potência da cultura ballroom

O reencontro que virou hit: Roger e Livinho lançam ‘Descobri que a Barbie’